sexta-feira, janeiro 05, 2007

OPINIÃO QUE CONTA

QUE NOVA ESTRATÉGIA PARA O IRAQUE ?
- a opinião de Immanuel Wallerstein

O presidente George W. Bush vem proclamando desde há um mês que está à procura de uma "nova estratégia" para a "vitória" no Iraque, e que está a fazer consultas amplas sobre que estratégia deve ser essa. Dadas todas as pistas e informações que chegam, são poucos os que estão de respiração suspensa à espera do discurso presidencial que vai revelar as suas decisões.

A nova estratégia promete ser a velha estratégia, talvez com a diferença de um pequeno aumento de tropas americanas em Bagdad.
É verdade que o presidente admitiu pela primeira vez que os Estados Unidos ainda não estão a ganhar no Iraque, mas, diz ele, também não estão a perder. O número de pessoas que acredita nisto, nos Estados Unidos e fora, é cada vez menor. Um sondagem feita no início de Dezembro em seis nações ocidentais mostra que 66% dos americanos estão a favor da retirada das forças da coligação, e na Itália, Alemanha, Inglaterra, Espanha e França, estes números vão de 73% a 90%. Como o Financial Times disse num editorial, "Raras vezes os Estados Unidos tiveram tanta necessidade de amigos e de aliados."
E, em 7 de Dezembro, aniversário de Pearl Harbour, um senador republicano, Gordon Smith, que tinha apoiado a guerra desde o início, anunciou a mudança de posição. "Eu, pela minha parte, estou no fim da linha quando se trata de apoiar uma política que mantém os nossos soldados a patrulhar as mesmas ruas, da mesma maneira, fazendo-se explodir pelas mesmas bombas, dia após dia. Isto é absurdo. Pode até ser criminoso. Já não posso apoiar mais isto."


Por que está Bush a fazer esta grande encenação sobre uma nova estratégia, quando tenciona claramente continuar a antiga?
Duas razões: as eleições de Novembro, e o relatório Baker-Hamilton. As eleições mostraram a Bush que a política do Iraque causou um sério desgaste na força eleitoral do Partido Republicano. Será claramente preciso mais do que despedir Donald Rumsfeld para reverter a actual queda livre dos candidatos republicanos, particularmente se 2007 trouxer aumento nos números de baixas no Iraque, se trouxer uma limpeza étnica crescente, uma maior queda do dólar e um maior declínio dos padrões de vida dos 80% mais pobres da população dos EUA.

Quanto ao relatório Baker-Hamilton, a sua frase inicial é "A situação no Iraque é grave e está a deteriorar-se." Discutiu-se muito se este relatório do Grupo de Estudos do Iraque poderia convencer Bush a seguir as suas inúmeras, e nem todas ousadas, sugestões de mudança. Mas este nunca foi o seu objectivo. Nem Baker nem Hamilton são bobos. Ambos são velhos profissionais da política dos EUA. O objectivo do relatório era legitimar as críticas do establishment tradicional do centro da vida política americana, e claramente conseguiu-o. Observem a declaração do senador Smith. Observem o crescente arrojo dos oficiais militares quando tornam público o seu cepticismo.

O que vai então acontecer?
Bush vai optar pelo plano de ampliar o número de tropas americanas. Como foi assinalado por todos os comentadores sérios, isto não vai fazer qualquer diferença. Claro, se os EUA mandassem 300 mil soldados, talvez conseguissem esmagar tanto a insurgência quanto a guerra civil. Mas enviar mais 30 mil soldados será uma incrível pressão sobre o estado e a moral dos militares americanos. Em Junho de 2007, o mais tardar, ficará claro até para o mais teimoso cego, como George W. Bush e os neoconservadores sobreviventes, que os Estados Unidos estão num beco sem saída e feridos de morte.

Mas então porque é que Bush não abandona logo esta estratégia que tanto prejuízo lhe dá?
Não pode. Toda a sua presidência gira em torno da guerra do Iraque. Se ele tentar reduzir as perdas, estará a admitir que é o responsável por um desastre nacional. Por isso, não tem escolha senão tentar prosseguir o bluff até 2009, e entregar o desastre a outro. Quer dizer: não há escolha que seja aceitável por ele. Mas Bush vai aprender uma coisa nos próximos 18 meses. A situação está fora de controle e até o presidente dos Estados Unidos pode ser forçado a fazer coisas que acha abomináveis.


Em primeiro lugar, há a pressão do eleitorado dos EUA e consequentemente dos políticos. O número de republicanos racionais e de democratas tímidos que querem distância da guerra cresce diariamente. Já podemos observar este fenómeno nas declarações do senador Joseph Biden - um dos senadores democratas mais conservadores, e próximo presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado - de que fará audições (audições claramente hostis) sobre os objectivos de um aumento de tropas no Iraque. O meu palpite é que, na acalorada disputa democrata sobre a nomeação presidencial, haverá um impulso - lento, no início e depois muito acelerado - para uma posição abertamente antiguerra. Vemos isto nas posições que estão a ser assumidas pelos aspirantes à nomeação Barack Obama e John Edwards. Hillary Clinton não estará muito tempo atrás deles. E, quando isso acontecer, ou os aspirantes republicanos seguem o mesmo caminho ou condenam-se à derrota eleitoral.

Além disso, há os generais. Parece que o novo Secretário da Defesa, Robert Gates, recebeu o encargo de pôr os militares dissidentes na linha. O general John Abizaid vai-se "reformar" dentro de poucos meses e o general George Casey tem atenuado a sua oposição aberta. O próprio Gates teve provavelmente de engolir muitos sapos para seguir esta política. Quanto tempo isto vai durar? Seis meses no máximo.

A vida é difícil para um comandante-em-chefe que perde as guerras. Isto vale para todos os lados e todos os tempos. Não vai ser diferente nos Estados Unidos da América.

Immanuel Wallerstein
1/1/2007

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